quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Impressões sobre Cinema: Peixe Grande e suas Histórias Maravilhosas


A Verdade contida na fantasia de Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas

Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas (Big Fish), 2003, EUA
Direção: Tim Burton
Roteiro: Daniel Wallace (escritor), John August
Elenco original: Ewan McGregor, Albert Finney, Billy Crudup, Jessica Lange, Helena Bonham Carter, Alison Lohman
Gênero: drama, comédia, fantasia
(dados retirados do site:  http://pt.wikipedia.org/wiki/Big_Fish)

Tim Burton parece escapulir do seu mundo sempre sombrio para uma fantasia iluminada em Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas ao contar a história de Edward Bloom, um caixeiro viajante, que em suas viagens encontra personagens inusitadas envolvidas em situações inacreditáveis. Aqui o enredo é feito por sequências paralelas em que correm as histórias de Bloom jovem e de um Bloom já entrado em anos. A grande força de Burton não está no tétrico como, p.ex.,  Sweeney Todd - O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet (entre outros) ou as animações O Estranho Mundo de Jack e Noiva Cadáver, mas na grande fantasia que a nossa imaginação pode criar para colorir o nosso entorno. É claro que o tom sombrio peculiar do diretor aparece na atmosfera geral do filme, como por exemplo, a forma e luz da floresta que Bloom tem que atravessar,  a estranha cidade perdida no meio da floresta e seus descalços habitantes, o circo e seu transmorfo* dono (Danny De Vitto) e a casa torta de Jenny e, possivelmente da bruxa, ambas representadas estupendamente por  Helena Bonham Carter (aliás, um bom preâmbulo para a sua atuação em Harry Potter).
Assim, Edward Bloom (Ewan McGregor e Albert Finney, maravilhosos) é a capacidade de sonhar personificada. Sua verdade é a fantasia que seu filho Willian, Billy Crudup (perfeito em representar a contida emoção de Willian), não compreende, por conta de sua mágoa: Bloom pouco participou de sua infância.  E, por isso, todas as suas histórias passaram a não ter valor para ele: a bela fantasia romântica da paixão de Bloom pela mãe que o fez seguir ao seu encontro, o gigante que assuntava a sua cidade, as siamesas na guerra, o circo que aparece em sua busca pela mãe de Willian, o peixe grande etc etc. Mas ao ser confrontado, na iminência da morte de seu pai, Willian, ironicamente, um escritor, é obrigado a rever o seu passado e do seu pai, buscando a Verdade do que é realmente Edward Bloom.


Creio que, uma das possíveis interpretações que este filme traz é fazer com que nos apresentemos novamente à capacidade de sonhar de olhos abertos. Capacidade  essa que pode estar guardada na nossa criança interior, na nossa lembrança infantil que se perde, muitas vezes, ao nos depararmos com o que nos é apresentado pelo mundo: os choques, as castrações, a aridez e até a vergonha de ser. A realidade, de fato, é uma grande fantasia, pois participa de nossa maneira única de ver o mundo, que, ainda bem, é diferente para cada um, pois o enriquece. Nossa experiência única pode transformar um objeto qualquer, aparentemente igual para todos, em possibilidades diversas de ver este objeto. Esta relação é singular para mim e para outros já que a lembrança, a memória o torna singular: a nossa própria experiência vivida com este objeto. Assim, a fantasia de Bloom é a sua Verdade e nisso seu filho não sabia acreditar. Perdeu a capacidade para tal, pois tudo, para ele, precisava ter lógica absoluta, empírica, cartesiana. O mundo das certezas, onde se sentia seguro. Por mágoa, ele foi para o lado oposto do pai, mas retorna para si ao perdoá-lo, ou melhor, entendê-lo, no momento em que foi obrigado a terminar a história do pai de forma verdadeira e totalmente condizente com o que era Bloom: o peixe grande contador de histórias. A meu ver, esse filme justifica o percurso de  Tim Burton com todo o seu arcabouço que sustenta seus filmes. É uma bela forma de explicá-lo e, ao mesmo tempo, dar a chance de nos questionarmos sobre nossos já a muito perdidos sonhos ou quase perdidos. Um resgate.
Bem, dá para notar que adorei este filme!!!
#ficadica para quem não viu e para quem viu, rever!

* Tomando emprestado o termo transmorfo, pessoas que se transformam em animais ou insetos, de True Blood, série de Alan Ball de 2008.

2 comentários:

  1. ... acho que são raros os filmes que me tocaram tanto e de forma tão profunda como "Peixe Grande". Agradeço a você Clau por me apresentá-lo e, já aproveito o ensejo pedindo novas indicações maravilhosas como essa!
    Entre fantasia e realidade concordo com o que diz: "Nossa experiência única pode transformar um objeto qualquer, aparentemente igual para todos, em possibilidades diversas de ver este objeto." [...] aqui, troco a palavra objeto para situação e [...] "Assim, a fantasia de Bloom é a sua Verdade e nisso seu filho não sabia acreditar. Perdeu a capacidade para tal, pois tudo, para ele, precisava ter lógica absoluta, empírica, cartesiana. O mundo das certezas, onde se sentia seguro." infelizmente, vejo isso de 'não saber acreditar' em muita gente e, como é triste saber que tem pessoas que não acreditam, muitas vezes em si próprio, nas situações da vida e nos outros.
    Fantástico filme, ótimo texto!

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  2. Ainda não vi o filme. Já tinha vontade de ver, depois desse texto, estou com mais vontande ainda. Assim como a Rê falou, aceito sugestões de mais filmes. :)

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